CUFA cria “Comunidade Segura e a Política Social D& Marketing Comercial”
Há seis
meses uma coincidência invadia a CUFA, durante a apresentação do
“Falcão”, documentário criado e dirigido pelo MvBill e por mim que
mostra a vida dos jovens envolvidos com o tráficonas favelas
brasileiras, assistíamos na nossa sede na companhia de crianças de uma
escola pública da comunidade, as escolas sempre nos procuram para
debater e orientar a meninada.
No decorrer do vídeo, mais uma vez, me deparei com a cena de um jovem sendo enterrado por sua família.
Apesar de a morte ter ocorrido durante mais um dos “confrontos
insanos”, o enterro não foi financiado pelos seus chefes por alguma
razão. Sua família, como quase todas as outras, recorreu à boa vontade e
solidariedade dos vizinhos e amigos para enterrar com dignidade seu
ente querido.
A história se repetia como muitas outras vezes, a
coincidência surgiu quando um colaborador da CUFA interrompeu a sessão e
disse que uma moradora estava a minha procura e o seu pedido era
exatamente o que acabávamos de ver no documentário; ela recorria à CUFA
para fazer uma última homenagem a seu sobrinho, um sepultamento
simples, porém digno, esse não tinha nenhuma ligação com o tráfico,
morreu praticando esporte, bateu a cabeça num ferro que era na verdade
uma trave improvisada, uma cruel fatalidade, percebi ai que mesmo as
mortes sendo diferentes, as necessidades eram exatamente as mesmas,
independente da existência de parentesco!
Lembro bem que na época das gravações do Falcão, uma das coisas que
eu pensava era sugerir aos governos um programa de seguro de vida e
acidente para os moradores de favelas, uma espécie de Bolsa família para
utilização somente nesses momentos difíceis onde não se tem a quem
recorrer, com objetivo de proporcionar um momento mais digno em uma hora
tão difícil!
Porém, no caso do Bolsa Família oferecido pelo Governo, mesmo o
programa atendendo muitas das necessidades, quando essas pessoas são
atingidas por uma fatalidade, até onde sei, elas não tem nenhum tipo de
amparo, nenhum programa que as mantém com alimentação, remédios, ou um
apoio financeiro para aluguel e as necessidades básicas como água e luz,
por exemplo.
Na época eu pensava que deveriam pensar num seguro não só para as
pessoas, mas para o próprio programa, desde que fosse algo viável,
legal e seguro.
Bem, razões para pensar em seguro para essas pessoas não faltam, mas
posso citar uma das principais razões: Nas favelas, ou comunidades, a
tensão é muito maior e todos estão diariamente expostos à morte ou
invalidez permanente, seja por guerra entre o tráfico, do tráfico contra
policia, milícias, ou mesmo pelas irregularidades dos terrenos, isso
citando somente alguns dos problemas, se não vamos falar das centenas de
mortes no verão por conseqüência das chuvas e deslizamentos e tantos
outros problemas que são enfrentados diariamente. Concordo que parte
desses problemas não são exclusivos das favelas, mas não devemos
esquecer que esses territórios são historicamente abandonados, apesar de
seus moradores pagarem igualmente todos os impostos ao adquirirem
qualquer bem em qualquer estabelecimento comercial ou cultural nas
cidades.
É certo também que apesar de parte da sociedade, achar que essas
vidas “valem menos”, ledo engano, o valor é o mesmo, trata-se de vidas
independente da situação que se encontram; Mas o desprezo à vida não é o
meu foco nesse momento, pelo contrário, a valorização dela é o que esta
em questão aqui.
Esse seguro seria uma forma da família ter um respaldo nesses
momentos tão difíceis e assim não precisar recorrer a “lideranças” das
favelas, que nessas ocasiões são os departamentos locais que dispõe de
recursos para sanar parte da dor e amparar com o mínimo de dignidade.
Isso quando não são levados a contar com eles para alimentar os sombrios
meses que virão.
Infelizmente sabemos que ninguém se prepara para o pior, então quando
ele chega, de fato, somos pegos desprevenidos e essa cultura não é um
“privilégio” só de quem mora nas favelas, porém, como meu foco social
são as favelas e seu desenvolvimento, é da sua segurança aqui que desejo
falar.
O fato é, tudo que eu disse até aqui continua latente, mesmo as
classes C,D e E serem hoje referência de consumo e de acesso, um seguro
de vida ainda é uma realidade muito distante, ou pelo menos ERA até
agora!
Pensando em todas essas informações resolvi fazer uma pesquisa
através da Liga dos Empreendedores Comunitários da CUFA, a princípio só
na Cidade de Deus, Complexo do Alemão e Rocinha. Minha intenção era
saber quem já possuía seguro de vida.
Foram abordadas cerca de 1.500 pessoas, e como já imaginava, menos de
1% dessas pessoas tinham um seguro, além disso, também pudemos apurar
que todas as outras, sequer sabiam, o que era necessário para se ter um
seguro.
Entre os entrevistados 91% disseram que SIM, gostariam de ter um seguro, mas desde que esse não comprometesse seus orçamentos.
Munido dessas informações comecei minha busca, esbocei um projeto e
visitei uma empresa, que me recebeu muito bem, me encaminharam para o
Departamento de política de relacionamento comunitário.
A resposta foi a seguinte: “Adoraríamos participar de um projeto onde
o foco é a segurança das pessoas, principalmente com a CUFA, pois
admiramos e sabemos a relevância do trabalho desenvolvido por vocês. Me
deu parabéns e disse que Infelizmente a empresa não estava preparada
para esse tipo de investimento!”.
Como nada, nunca foi fácil, essa negativa seria a primeira, e eu não
poderia esmorecer, sempre acreditei e acredito em tudo que faço, e parti
para mais uma investida, desta vez um grande supermercado.
No supermercado me encaminharam ao diretor de Marketing, ele foi
muito solícito, adorou o projeto e disse que, de fato, seria um sucesso
de marketing, mas disse que infelizmente não tinha disponíveis recursos
para investir nas favelas, mesmo entendendo que o consumo nas favelas
hoje seja responsável por uma fatia generosa na economia do Rio.
Comecei a achar que o problema estava comigo, que eu precisava de
dados, liguei para o Data Popular , mais importante Instituto de
Pesquisa do País no que diz respeito as classes C,D e E e colhi várias
informações para ajudar no processo de convencimento. Vocês sabiam que
hoje as favelas no Rio consomem 13 Bilhões por ano?! Isso mesmo, 13
BILHÕES, segundo o instituto Data Popular. Alias , é o instituto que
convidaremos para acompanhar e medir o impacto desse projeto na vida
das pessoas que vão recebê-lo e no comercio das favelas que serão
parceiros.
Tive então minha segunda negativa, agradeci a atenção e parti em
busca de outra empresa, essa me recebeu e encaminhou ao departamento de
projetos sociais, no primeiro momento fiquei muito entusiasmado e
pensei: Pronto encontrei o que precisava!
A responsável pelo departamento disse que minha idéia era tudo que
ela queria, e que levaria a pauta para reunião de diretoria, e assim que
possível me retornaria.
E ela retornou com o seguinte: “Celso, o projeto foi muito bem
avaliado, porém foi vetado pelo departamento comercial-Financeiro,
acusaram meu departamento dizendo que só pensamos em gastar e que,
somente eles, têm responsabilidade social, pois são as vendas que
viabilizam a existência da Companhia, boa sorte na sua caminhada, o
projeto é lindo e humano.”
Entendi seu desabafo, agradeci, agora eu sabia que o comercial era o meu foco central !.
Voltei na primeira empresa por mim visitada, já com novos dados e
levando até um assessor do “asfalto” para impressioná-los, fomos
recebidos pelo comercial, que aprovou de imediato, mas disseram que o
ideal seria procurar a Presidente Dilma, que muitos projetos do governo
são importantes, mas esquecem da segurança das pessoas, que a Dilma e o
Governador Sergio Cabral que precisavam olhar para essa direção, não as
empresas privadas.
Disseram ainda que o problema, na sua empresa, é a dificuldade de
conseguir atingir a plena comunicação entre os departamentos, que na
verdade fingem uma convivência pacífica!
Senti um pouco de deboche, mas como era o mesmo discurso da senhora
do social da empresa anterior, me comportei como um lorde, segurei minha
onda, e como esse mundo dos negócios não é a minha praia, vai ver eles
tinham razão mesmo, espero que eles se entendam.
Alguém já me viu desistir de alguma coisa que acredito? Pensei, vou
chamar a Nega Gizza , o Bill e vamos nós mesmos fazer um teste, já que
essa visão se consolidou na CDD “Cidade de Deus”.
Surgia então o projeto “Cufa, COMUNIDADE SEGURA”
Como expliquei, superficialmente, no começo desse texto, o projeto
surgiu a partir da necessidade latente em resguardar essa camada da
sociedade que, de fato, precisa de maior seguridade social. Considerando
o desejo de possuir um seguro de vida, conforme me mostravam os
números, eu precisava colocar a idéia em pratica!
Fazer um seguro de vida ainda é um pensamento muito distante para
essas pessoas, mesmo que micro, tanto que as corretoras e bancos
resistem em arriscar um investimento se quer razoável, só fazem de
maneira tímida, já que esse público ainda não mostra nenhum dado
concreto a esse respeito, até que eles descubram que a favela não
precisa de interlocução, ela já é protagonista das suas inspirações.
Meu próximo passo seria entender, buscar informações sobre seguro, e se houvesse viabilidade eu levaria aquele rascunho adiante.
Busquei no mercado pessoas com conhecimento em seguro e que pudessem
me assessorar, e encontrei os papas do assunto, Carlos Ruy e Jose
Rodolpho Busch, seguimos em frente e os próximos passos seriam fechar os
números , uma corretora e uma seguradora, e meu papel com o Bill seria
convencer os comerciantes das favelas a entrarem no projeto.
Depois de muitos exercícios matemáticos chegamos a uma única
conclusão: Um seguro individual seria impossível fazer no valor que eu
sonhava, R$ 0,35 por mês. A idéia era evitar que os moradores pagassem,
pois cobrar esse valor mensal seria mais caro do que receber, então a
solução foi a parceria, a titulo de teste de viabilidade com o comercio
das favelas, pois eles viabilizariam esses seguros, em contra partida
seria a priorização, por parte dos assegurados, desses estabelecimentos
para efetuar suas compras. Não foi difícil convencê-los, graças
inclusive ao momento que vivem os comerciantes nesses lugares.
Partimos então para a seguradora, já na primeira reunião com o
acionista ele disse: “Respeito a CUFA e amei o projeto, não consigo
fazer a esse preço, mas vamos fechar a R$ 0,50 por mês ( R$ 6,00 por
ano). Vou participar do projeto piloto por muitas razões Celso,
inclusive porque é um bom negócio para minha empresa, e faço questão que
não faça referência ao nosso nome, pois o que me anima nessa operação é
participar de um projeto de valorização da vida, isso é o que faz a
diferença, ter lucro fazendo o bem as pessoas. Conte comigo!“
Martelo batido, agora o projeto tinha o dinheiro, a seguradora e resolvi que a própria CUFA criaria uma corretora.
A próxima reunião foi com a seguradora, CUFA e com os comerciantes parceiros e ficou acordado o seguinte:
Teste com 50 mil pessoas, distribuídas em:
Rio de Janeiro
Cidade de Deus
Complexo do Alemão
Rocinha
São Paulo
Paraisópolis
Capão Redondo
Porto Alegre
Restinga
Fortaleza
Lagamar
Brasília
Cinelândia
Mato Grosso
Osmar Cabral
A apólice será no valor de R$ 12.000,00 doze mil reais, dividido da seguinte forma:
- R$ 5.000,00 por Morte Acidental;
- R$ 5.000,00 por Invalidez Permanente por Acidente;
- R$ 1.000,00 para Auxilio Alimentação na falta do mantenedor em caso de acidente;
- R$1.000,00 para Auxilio Funeral (Morte Qualquer Causa).
Diga-se de passagem, muito menos que um “baseado” ou uma garrafa de
cerveja, comparando-se a 1 ano de seguro com proteção 24h por dia.
O seguro será exatamente como qualquer outro seguro de vida, cobre morte, invalidez total ou parcial permanente entre outros.
Vamos começar a fase de testes e beneficiar a população, pelo menos
num primeiro momento com o custo viabilizado pelo comercio local, depois
desse piloto vamos lançar um projetão chamado PSD&MC, claro ele vai precisar se mostrar viável.
Política Social & Marketing Comercial.
O PS&MC é
mais do que uma resposta aos departamentos das empresas que visitei, e
as tentativas mal sucedidas dos micro seguros, é sobre tudo uma
sugestões de ações integradas, consiste em parcerias socialmente
inteligentes!!
Pensando num exercício prático, uma empresa X entra com o valor de
R$ 6,00/ano, por pessoa, ou R$ 0,50 por mês, e se for agressivo,
pode-se pensar numa apólice para um milhão de pessoas, que custaria 6
milhões, parece muito não é?!
Sabemos que o valor é muito mais baixo do que muitas campanhas
singelas, e essa empresa viabilizaria a “segurança” de um milhão de
pessoas que e seriam suas companheiras nos 365 dias do ano, e num caso
de sinistro, é com essa empresa, representada pela seguradora que essas
pessoas vão contar. Com certeza algo SOCIALMENTE jamais visto.
Seguindo essa lógica, para essas pessoas renovarem seus seguros,
basta apresentar ao estipulante, a CUFA, uma quantidade de cupons de
produtos dessa empresa adquiridos durante todo o ano, ou seja, será um
único investimento, e a fidelização e manutenção da relação se dará no
processo de construção da relação entre os moradores e a empresa, claro
que com isso essa empresa além de só investir uma única vez, vai
aumentar as vendas consideravelmente, tornando o projeto viável e
sustentável COMERCIALMENTE .
Se pensarmos em MARKETING, esse número tende a
crescer, e nenhuma empresa concorrente teria um mailing list tão
volumoso e fiel. E mais, quando o cidadão se deparar com duvida em
adquirir um seguro de vida para a família ou comprar determinados
produtos, a duvida terminará ao saber que com o produto da empresa
parceira ele terá as duas coisas ao mesmo tempo. Consolidando assim
uma POLITICA de relacionamento da empresa internamente
entre os setores e externamente com uma política de fidelização dos
seus consumidores.
Mas existem ainda outras formas de acessar o projeto, como por
exemplo, parcerias com universidades quando cada aluno tem a opção de
fazer um seguro de R$ 0,90 por mês, ou seja, R$ 10.80 por ano, diluído
nos seus carnês que em geral passa de R$ 300,00 mês. E nesse seguro de
vida ele além de fazer um seguro pessoal nas mesmas condições acima,
terá oportunidade de financiar um seguro para um morador de alguma
comunidade da sua cidade.
Sendo que os outros R$ 0,10 será a contra partida do outro parceiro, a universidade.
Na pratica o PSD&MC, trata-se
de um quadrilátero onde unimos as pontas de uma empresa com seus 4,
principais, pilares Comercial, Político, Social e Marketing.
Todas as empresas têm como objetivo vender seus produtos, para tal é
feito um trabalho de marketing e com essas campanhas de MKT se atingi o
objetivo comercial, venda do produto em questão; O lado social as
empresas empregam em alguns projetos, que quase nunca está ligado ao seu
produto.
Mas e o Governos e o Legislativo com isso?!?
O Estado, além de promover a política de segurança pública, pode
participar mais ativamente desse projeto, nada impede que a Dilma,
Sergio Cabral ou mesmo o Parlamento percam a chance de estar mais
atentos sobre o anseio dessas pessoas.
Hoje existe por exemplo um debate sobre o destino das emendas
parlamentares, se um único parlamentar federal por estado, que tenha
compromisso com essa população fizesse uma parceria com esse projeto
usando parte dos seus 14 milhões para ser destinados a projetos sociais
como esse, imagina a revolução?!
Assim o discurso de que todos querem favelas mais seguras se
transformaria em algo concreto, pelo menos até termos uma política de
habitação que faça das favelas coisa do passado!
Pronto!! consegui colocar no papel um pensamento, o PSD&MC,
fechando o quadrado onde 25% de cada pilar que constitui uma empresa
beneficiam a sociedade atingi um numero significativo de pessoas e vende
seu produto!
Claro que se eu fosse formado em economia periférica com
especialização em Harvad , esse texto seria melhor escrito, como viraria
artigo de grandes veículos, mas o importante aqui é o compromisso de
criar uma “Comunidade Segura “, e fazer nascer também a sua
oportunidade de construir a maior intervenção de segurança Social que se
tem noticia.
“Tamu” Junto e assegurado!
Lançamento do Comunidade Segura:
Rio de Janeiro
29 - Setembro - Cidade de Deus
30 - Setembro - Complexo do Alemão
30 - Setembro – Rocinha
São Paulo
13 - Outubro – Paraisópolis
14 - Outubro – Capão Redondo
Porto Alegre
20 - de outubro - Restinga
Fortaleza
21 - Outubro - Lagamar
Brasília
24 - Outubro Cinelândia
Mato Grosso
24 – Outubro – Osmar Cabral
Para maiores informações ou para se inscrever procure a cufa da sua Comunidade Site – www.cufa.org.br
Twitter – @ComuSegura
Celso Athayde
É Secretario geral da Central Única das Favelas
Rio de Janeiro
19-09-2012
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